9 de mai. de 2010

O MAGO

Ao ver o cartaz marcado pelas malévolas garras do tempo colado no sujo acabamento da parede do teatro prestes a ser derrubada ordenei que parassem o serviço para que eu pudesse ler seu conteúdo. Retirei os óculos do bolso da camisa molhada com o suor de meu mavioso peito de macho malhado. Pude então ler, em voz alta; Âmago, hoje pudica a prestação, vitrine uma honra! Rápido um dos imbecis que trabalhavam comigo arrancou da parede o amarelado cartaz e o leu encarando-me; O mago, hoje única apresentação, vinte e uma horas!
Após sofrer tamanha humilhação e engolir a extrema falta de respeito com meu pequeno problema de visão ordenei que os serviços continuassem.
Aproximou-se um homem, enrugado, arqueado, fedorento que, com uma voz cavernosa começou a contar-me a história do Mago;
- O Mago, lembro-me como se fosse hoje, sua última apresentação, uma injustiça o que fizeram com ele. Era uma sexta feira, 13 de Agosto... Depois de apresentar inúmeros truques de sua mágica e por isso ser muito aplaudido pediu a colaboração de alguém da plateia. Uma menina bonita subiu ao palco agarrada a seu ursinho de pelúcia, ursinho este que o Mago pegou e fez desaparecer em sua cartola mas. enquanto bradava palavras mágicas a menina começou a chorar, chorava por seu amigo de pelúcia. Por algum truque do destino o Mago não conseguiu mais retirá-lo da cartola. O público, tomado pelas dores da menina trasformou-se começou a vaiar e bradar palavrões. O Mago tentava desesperadamente recuperar o ursinho quando foi atingido por algo jogado por um espectador mais afoito. Perdeu o equilíbrio e caiu em uma caixa preta cheia de espadas pontiagudas que utilizaria em outro truque. Foi fatal. A caixa fechou-se esmagando-o, no mesmo momento o telhado do teatro começou a desabar. O pânico instalou-se e o público promoveu uma correria de grandes proporções. Foi a última apresentação no palco deste teatro. O corpo do Mago nunca foi encontrado. Sua sepultura a caixa de espadas.
Era uma história interessante porem eu, homem de obras não podia perder tempo , deixei o enrugado, arqueado e fedorento homem e continuei meus afazeres de chefe da demolição.
Sob minhas bem elaboradas ordens as paredes foram caindo, uma a uma. Os escombros foram sendo removidos pelas máquinas.
Um grito de macho forte que eu dera interrompeu os serviços, o expediente se encerrara. Como bom comandante, postado sobre um dos mais altos montes de escombros observei a saída dos operários. Quando todos haviam partido e eu voltava a minha pose de homem comum senti sobre meus pés a terra movimentando-se. abria-se a tampa de um caixão empurrada por uma mão grande, forte e suja. Sem pestanejar, característica de um grande líder, voltei a pose de comando e gritei; Muito bem! qual seu nome? Estava dormindo no serviço? Não se apresente amanhã, esta despedido!
O homem soltou alguns grunhidos roucos, considerei aquilo um desrespeito a minha figura e peguei meu caderno de obras para anotar o fato. Perguntei seu nome e anotei; Pedi-lhe a ferramenta que trazia na mão e ele entregou-me um ursinho de pelúcia.
No ônibus, quando voltava para casa lembrei-me da história do enrugado, arqueado e fedorento velho, lembrei-me do nome; O Mago. Sua morte horrível, da menina e do ursinho. Com minha mente rápida e lúcida percebi que a demolição desenterrara o Mago. Desci na primeira parada. Retornei ao teatro e o encontrei o caixão fechado coberto de restos de demolição como se nunca houvesse sido aberto. Intrigado pensei, fiz pose para isso, para que fluísse melhor. Não achei explicação para o que estava presenciando.
Sentindo-me ridículo resolvi retirar-me, foi quando uma surgiu uma voz grave; Por favor, devolva o ursinho a menina, assim minha alma descansara!
Um arrepio percorreu minha coluna de macho ouriçando até os cabelos de meu peito. Suei frio, rangi os dentes, minha testa gelou e meus culhões encolheram e subiram escondendo-se dentro de mim. Eram os sinais típicos do medo que raras vezes dominavam meu corpo de macho malhado.
Apesar de tudo mantive uma certa valentia, suficiente para que conseguisse pronunciar; E se eu não devolver?
A voz rouca e cadavérica respondeu-me; Quando o primeiro raio de sol surgir amanhã, sua tarefa devera estar cumprida ou sua alma será requisitada, encarnaras no ursinho de pelúcia e viveras assim pela eternidade!
Retirei-me preocupado com o que ouvira, cheguei a pensar que não ouvira mas lembrei-me que meu pequeno defeito era de visão e não de audição. Entrei em pânico, precisava encontrar a menina do ursinho.
Por onde começar, farejei, corri atrás do enrugado, arqueado e fedorento velho, ninguém sabia dele. Perambulei por toda a cidade atrás de alguém que conhecesse a história do Mago e da menina, alguns conheciam o fato mas nada sabiam sobre a menina e seu paradeiro. Fui a biblioteca ler velhos jornais, achei a reportagem do fato mas não haviam publicado o nome da menina.
Desisti, sem saber o que mais fazer desci ao mais baixo nível que um homem de minha categoria poderia ir, voltar para casa e consolar-se com sua esposa.
Não, não estou sendo prepotente ou coisa parecida, minha esposa é loira e por conseguinte... Por isso consolar-se com ela é cair no vazio, é escorar-se em pé de vento.
Cheguei com o desespero estampado no rosto, fitei-a; Querida escuta, ouça-me, preste atenção!
Foi o meu erro , ela indignou-se e como sempre fazia começou a berrar; Eu não sou burra, sou sua esposa, sou loira mas sou gente viu! Gente, com jota maiusculo! E não falo mais com você por uma semana tá, seis dias!
Isso já ocorrera inúmeras vezes e o pior é que ela cumpria o prometido pois como boa burra seguidamente empacava. como a situação era extrema contei a ela todo o ocorrido na esperança de ter seu consolo em meus últimos momentos. Acabei a narrativa e ela pegou um papel e um lápis. Peguei o bilhete e li; Ame a mim e minha mãe!
Não entendi nada, prometi amar-lhe a a sua mãe e fui deitar, cansado e aceitando meu destino.
Ao amanhecer, senti minha alma aconchegando-se em meio a lã que recheava o ursinho.
Passados, os seis dias ou uma semana conforme minha esposa, estou aqui jogado sobre o sofá ouvindo-a ler e reler o bilhete; A menina é minha mãe! Tá ouvindo ursinho! A menina é minha mãe!

3 de mai. de 2010

OS QUATRO GAJOS

A maresia ou a vista bucólica do horizonte ou o cheiro de peixe podre ou as secretárias da beira do cais, eles não sabiam o que lhes atraia para aquele lugar, o certo é que todas as sextas feiras à noite encontravam-se ali.
Quatro jovens, ou melhor quatro gajos (eram as docas de Portugal), sentados contemplavam. Saudades de Liverpool no além mar. George exclamava; God save the queen, Ringo exclamava; I love Liverpool, Paul exclamava; Hei de chegar lá e Jonh exclamava; Hei Jude!
Toda essa lenga-lenga de lamentações tinham seus dias contados com a proposta que lhes fez um velho marinheiro; Gajos, quereis fazer parte de uma excursão as Índias? Deverá partir as doze horas de amanhã desta doca, Podereis escolher entre as naus Santa Maria, Nina e Pinta e talvez a nau Catarineta se consertada a tempo. A excursão constara de um agradável cruzeiro pelo Atlântico terminando com um espetacular convescote em local a ser definido pelos ventos que porventura cruzarem nossos caminhos em altomar. Então, topam?
Tentados a aceitar os quatro gajos puseram-se a exclamar, primeiro foi George; Poderei rever Liverpool, depois foi Ringo; Poderei rever a England, depois Paul; Poderei rever a Queeen e por último Jonh; Poderei rever Yoko!
Doze horas do dia seguinte lá estavam os quatro prontos para embarcar. Aguardavam quando George descobriu que o capitão seria um tal de Pedro Alvares, substituíria Cristovão que amanhecera com diarréia causada por um ovo podre que comera em pé. Ringo descobriu que o velho marinheiro que os convidara se chamava Pero Vaz, Paul descobriu que o caminho das Índias não estava no mapa e Jonh descobriu que as naus Santa Maria, Nina e Pinta seriam seguidas pelo Yelow Submarine.
As naus partiram as doze horas, as treze horas as náuseas vieram. As catorze horas os gajos remungavam. George resmungava; Ai! Ringo resmungava; Ui! Paul resmungava; Ãmmm! Jonh resmungava; Help!
Em viagens longas o tempo é a cura e em naus que só tem homens o perigo é a curra. George percebeu isso quando um enorme grumete chamou-o de Darling, Ringo vendo a situação ficar preta reagiu em defesa de George; No, George is espada! Paul igualmente partiu em defesa do amigo e com o dedo em riste gritou; George not dar o cu! Jonh, alterado, bradou; quem falou em Yoko? Depois de muita explicação George, Ringo e Paul conseguiram convencer Jonh de que niguém havia falado em Yoko, ele aceitou as explicações mas deixou o recado; Yoko, para mim é quem nem mãe, só tem Ono!
A viagem era chata, a paisagem só mar, nada de dividir ou multplicar, só mar, só mar. Subtrair então, nem pensar pois eles haviam se tornado inseparáveis após o incidente com o grumete. Sempre juntos forever unidos never subtraídos.
Certo dia estavam junto a murada admirando a pequena embarcação de Almir Klink que passava pela nau fazendo propaganda do Gatorade quando sem motivo aparente George começou a cantar; Como uma onda no mar, nada do que foi será..., Ringo aproveitando o embalo cantou; Esse mar é meu, leva teu barco prá lá deste mar...., Paul enciumado também cantou; O mar passa saborosamente, o que? A língua! onde? Na areia! Jonh não se conteve e lascou; Sou mar, mar, mar, me chamam lobo mar... Foi ai que estourou a bunda do vagalume, um clarão, uma luz. Formariam um conjunto musical !
Incentivados pelo Sargento Pepers, membro influente da tripulação fundaram o mais famoso quarteto que já singrou os mares: ZeTbitles. O sucesso foi estrondoso, entre os marinheiros da nau não se falava outra coisa. Não se ouvia outra coisa e não se dançava outra coisa que não fosse o rock embaldo dos quatro rapazes. Os discos de Magal, Jaime e Erondi, Claudinho e Bochecha, foram atirados aos tubarões.
Logo o verdadeiro vagalhão de sucesso invadia as outras naus. O som trepidante tomava conta do oceano. Mérica, Mérica, Mérica...um massolin di fiori era entoado pelos gajos e reentoado pelos tripulantes enquanto naus argentinas passavam aceleradas além do limite permitido. As que não batiam nos atóis ou capotavam nas cristas das ondas eram mensageiras da nova música. Isto fez com que a fama dos ZTbitles chegassem ao continente bem antes que os próprios.
O chacoalhar das ancas dos marinheiros e grumetes mudou o rumo da excursão, o caminho das Índias ficara ao largo, as calmarias esperadas por Pedro Alvares não apareceram e desta forma as desorientadas naus foram parar em um lugar que o rapaz da gávea apelidou de Terra a vista.
Na praia, a recepcioná-los haviam índios e índias membros de um fã clube gritavam; Nós lóvi you desde Yesterday. Os mais afoitos corriam para arrancar-lhes as roupas, os canibais para arracar-lhes as carnes.
Naturalmente a fama do ZTbitles causou ciúmes em Pedro Alvares que chamou o Pero Vaz e ditou-lhe uma carta endereçada ao Rei; Erramos o caminho. Encontramos terra nova, há riqueza, homens e mulheres nus mas, sugiro que não percamos tempo com esta bosta!
Após carregarem toda a riqueza, comerem algumas indias, darem um pau nos índios e apelidarem a terra de Brasil zarparam deixando para trás os quatro rapazes, a semente da atual cultura musical da terra brasillis.